Inclusão social na prática: atuação das empresas brasileiras e entrevista com a Anglo American Brasil
Inclusão Social. Diversidade. Responsabilidade Social. As palavras viraram senso comum nos materiais de comunicação das empresas em todo o mundo. Resta saber, no entanto, se realmente foram incorporadas na cultura, nos valores e nas práticas das corporações.
Segundo pesquisa anual realizada pela DiversityInc, é cada vez maior o número de empresas que têm buscado adotar iniciativas que estimulem a equidade entre etnias, gêneros, classes sociais e necessidades especiais. No entanto, a pesquisa também mostra as dificuldades enfrentadas internamente para mudar hábitos e culturas no ambiente empresarial.
A partir da pesquisa foi gerada uma lista das 50 melhores empresas que adotaram práticas de diversidade e inclusão social. Entre elas apenas empresas de grande porte a atuação multinacional, nenhuma delas de origem brasileira.
Entre a legislação e a prática de inclusão social
No Brasil, a diversidade e a inclusão estão amparadas pela legislação, com destaque para a Lei Nº 13.146/2015, a Lei de Inclusão Social, que institui o Estatuto da Pessoa com Deficiência e tem como finalidade assegurar “condições de igualdade, o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais por pessoa com deficiência, visando à sua inclusão social e cidadania”.
No âmbito do trabalho, ainda há a Lei 8.213/91, também conhecida como a Lei de Cotas, que determina que as empresas com mais 100 funcionários deverão incluir em seu quadro, profissionais reabilitados ou com deficiência. Esse número será de 2% a 5% de profissionais, de acordo com a quantidade de funcionários da empresa.
No entanto, segundo dados publicados, em julho de 2016, pelo Ministério do Trabalho e Previdência Social, foram criadas pelas empresas pouco mais de 380 mil vagas para atendimento da Lei de Cotas. O número correto deveria ser mais de 827 mil postos de trabalho, considerando que 6,2% da população possui pelo menos algum tipo de deficiência, segundo dados do IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, e do Ministério da Saúde.
Ainda de acordo com o Ministério do Trabalho, a falta de fiscalização e a dificuldade de adaptação são apontadas pelas empresas como principais fatores para o não cumprimento da legislação.
Na prática, o que se percebe ainda é um grande desconhecimento, preconceito e a falta de interesse das empresas em promover a inclusão social. Em muitos casos, as empresas acabam arcando com multas e também prejuízos para a sua imagem.
Em busca de empresas que estão trabalhando para ir na contramão desse processo, entrevistamos a Anglo American Brasil.
Com sede em Londres, a Anglo American, que atua na área de mineração, tem operações no Sul da África, América do Sul e do Norte e Austrália.
No Brasil, a empresa possui mais de 3 mil empregados e está presente no Rio de Janeiro, Goiás e em Minas Gerais, com o escritório corporativo em Belo Horizonte.
A empresa hoje possui um Programa de Inclusão Social, inicialmente focado em pessoas com deficiência intelectual, mas que agora trabalha com diferentes tipos de deficiência, incluindo a contratação, integração e suporte aos colaboradores no processo.
Entenda como funciona o programa e os ganhos que a empresa vem conquistando com o trabalho de inclusão social:
INCLUO – A empresa hoje possui alguma política para inclusão e trabalho com diversidades? Em caso positivo, essa política também inclui pessoas com deficiência?
ANGLO – Temos o Programa Incluir, que busca a inclusão de pessoas com deficiência. A iniciativa começou em 2014, com foco em profissionais com deficiência intelectual. Hoje, nosso foco é incluir pessoas com deficiência lato sensu, ou seja, todos os diferentes tipos de deficiência.
Estamos atuando para, no médio prazo, alcançar o nosso objetivo de inclusão de forma integrada. A ideia é desenvolver a sensibilização de gestores e equipes, a aproximação com a família do profissional com deficiência, capacitações e parcerias com instituições que trabalham com inclusão.
Além das vagas, o Incluir também oferecerá capacitação para profissionais que não possuam experiência, em parceria com o Senai, no sentido de incentivar a inserção dessas pessoas no mercado de trabalho.
Quanto à diversidade, a Anglo American, por ser uma empresa global e trabalhar em vários países, com religiões, culturas e costumes bem diferentes, já considera a diversidade como um valor em todas as suas iniciativas.
INCLUO – Para a empresa, quais são as maiores dificuldades enfrentadas na hora de colocar em prática as políticas e programas de responsabilidade social, inclusão e diversidade?
ANGLO – Nossa operação, o Minas-Rio, é muito nova ainda, iniciamos em 2014. Estamos numa região em que, até pouco tempo atrás, a principal mão de obra era de trabalhadores rurais ou servidores públicos.
E as pessoas que tinham deficiência ficavam mais isoladas socialmente. Não havia muita oferta de trabalho para elas e não se acreditava que um dia haveria. Entre junho e julho desse ano, nós fizemos uma campanha para divulgar bem essas oportunidades de trabalho na empresa. As pessoas começaram a mostrar interesse.
Há cinco anos, talvez não aparecesse ninguém. A falta de escolaridade também é uma das dificuldades que estamos encontrando, o que parece evidenciar que a inclusão também é um desafio para as escolas.
Hoje, temos pessoas interessadas em trabalhar conosco e estamos oferecendo capacitação profissional. Há uma sensibilização interna, dos gestores para fomentar o respeito e a valorização das diferenças em nosso ambiente de trabalho, de forma a traduzir isso em diferencial competitivo.
Trabalhamos para sensibilizar e conscientizar a equipe, e também para adaptar o ambiente de trabalho aos novos contratados, de acordo com o tipo de deficiência apresentada. Afinal, as deficiências estão nos espaços, que precisam ser acessíveis para todos, e não nas pessoas.
INCLUO – Quantas pessoas nesse perfil estão contratadas?
ANGLO – Percentual de acordo com o tipo de deficiência, dentro do contingente de pessoas com deficiência contratadas pela Anglo American:
Física – 47%
Intelectual – 25%
Visual – 22%
Auditiva – 6%
INCLUO – Em quais áreas da empresa elas estão alocadas?
ANGLO – Várias áreas: Administrativo, Recursos Humanos, Suprimentos, e áreas operacionais (eletricistas, mecânicos, gerentes).
INCLUO – A empresa possui algum programa de integração ou adaptação, para as pessoas com a deficiência e/ou para os demais colaboradores? Como funciona?
ANGLO – Temos um programa de treinamento e de ambientação padrão.
Para as pessoas com deficiência intelectual, temos um treinamento específico, que inclui um sistema de tutoria.
Fica um profissional responsável por capacitar e ambientar o novo empregado e a gente faz o acompanhamento ao longo do primeiro ano na empresa.
INCLUO – Quais foram os desafios – infraestrutura, integração, gestão, capacitação, adequação – que a empresa enfrentou ou enfrenta?
ANGLO – O grande desafio aí são as pessoas e seus preconceitos. Temos experiências muito positivas. Além disso, queremos criar um comitê interno com as pessoas contratadas. O objetivo é discutir a inclusão na empresa.
Vamos ver com essas pessoas o que elas estão fazendo, ouvi-las, falar de adaptação ao ambiente de trabalho, aceitação, realização profissional.
Escutei uma vez que “o desafio é eles se sentirem valorizados como profissionais, e não como parte de cota”. É isso que queremos fazer: com que eles se sintam como profissionais, como todos os demais.
INCLUO – Quais foram os ganhos para a empresa – gestão de pessoas, marketing ou aprendizado?
ANGLO – O ganho maior foi em gestão de pessoas. Passamos a ter uma maior aproximação, mais empatia entre os empregados.
Já escutei de empregados frases como “nunca imaginei que fosse possível trabalhar com alguém com deficiência visual”.
E a sua empresa, o que anda fazendo pela inclusão social?
O Portal Incluo quer conhecer as práticas, políticas e programas das empresas voltados para a inclusão.
Entre em contato e apresente o seu case: contato@incluo.com.br
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